quinta-feira, 1 de maio de 2014

O que eu estava fazendo na manhã de 1º de maio de 1994?


Na época, tinha 11 anos de idade. Faltava menos de um mês para o meu aniversário. O Brasil já vivia a empolgação de mais uma Copa do Mundo, mas ninguém estava confiante na seleção. Era mais fácil apostar todo o dinheiro do mundo no tetracampeonato do Ayrton Senna do que na Seleção Brasileira. Afinal de contas, Parreira levava para os Estados Unidos um time considerado extremamente defensivo.

Como bom vascaíno, ainda estava um pouco chateado com o falecimento de Dener, nome considerado mais que certo na Seleção de 1994. Me lembro que, no Globo Esporte do dia seguinte ao seu falecimento, foi transmitido um especial sobre o jogador, com uma música de fundo cantada por Caetano Veloso. Até hoje essa música ecoa na minha cabeça, pois foi exatamente dela que me lembrei no fatídico 1º de maio de 1994.



Era um domingo como outro qualquer. Saí com minha bicicleta para comprar pão, leite e mortadela antes da corrida. A padaria até que ficava perto de casa, mas criei o hábito de andar de bicicleta todo domingo de manhã justamente por causa dos esportes a motor.

Nota: até sofrer um acidente sério de bicicleta, meu desejo era ter uma moto quando fizesse 18 anos.

Naquela temporada, não havia perdido uma corrida até então. Aliás, era raro perder uma etapa. A primeira corrida foi em Interlagos, Brasil. Expectativa para que o ídolo vencesse em casa, esperança que ficou 55ª volta, lá na Junção. Já na segunda etapa, no terrível circuito de Aida (incrível como a F1 já correu em circuitos tão fedorentos), o abandono de Senna logo na largada poupou o sono de muita gente.

Sendo assim, Senna ainda estava zerado no campeonato. San Marino era a terceira etapa e Schumacher liderava com certa folga (20 pontos), com Barrichello em segundo (7 pontos) e Hill e Berger dividindo a terceira colocação (6 pontos). O tricampeão (e único campeão no grid) precisa responder com urgência. Só a vitória interessava.

Foi um fim de semana negro para o automobilismo. Primeiro, o acidente que quase vitimou Barrichello. Por alguns minutos, o brasileiro realmente esteve bem perto da morte. Isso sem contar que ele teve MUITA sorte, pois se tivesse lesionado alguma vértebra, poderia hoje estar tetraplégico, devido ao fato dos fiscais terem desvirado o carro como se estivessem virando um saco de batata.



No dia seguinte, foi a vez de Roland Ratzenberger. Foi um dos piores acidentes fatais que já vi na minha vida. O sangue do piloto era evidente no capacete. Não gosto de lembrar, não gosto de comentar. 

Segundo as leis italianas, se um esportista morrer durante um evento esportivo, o evento deve ser cancelado e todo o complexo desportivo colocado à disposição dos peritos até o final da investigação que pode durar meses ou anos.  A discussão se concentra na determinação da hora e local da morte de Ratzenberger. Os organizadores da corrida e da FIA alegam que ele foi levado ainda com vida a Bolonha enquanto os investigadores alegam que ele teve morte instantânea ou, no mínimo, ainda dentro no circuito de Ímola. 


Ao anunciarem que a morte de Ratzenberger foi no hospital, essa atitude se tornou um divisor de águas no automobilismo mundial. Mais tarde explico.

Então, na sétima volta do GP de San Marino, na curva Tamburello, acontece o pior. Em todos os acidentes que ele sofreu (e que não foram poucos), Senna sempre procurou sair o mais rápido possível do carro. Dessa vez, ele ficou no carro, imóvel. Por um certo momento, ele balançou a cabeça. Mal sabíamos que esse seria seu último suspiro.


Minha mãe, que só viu a cena da batida, falou: "Ih, morreu...".
Virei pra ela e, com lágrimas nos olhos, gritava: "Cala a boca!"

Como queria que minha mãe estivesse errada. A serenidade em suas palavras me fez pensar no inevitável: Ayrton Senna, nosso herói das manhãs de domingo, que levantava o orgulho nacional em meio a crise financeira que o Brasil passava. poderia morrer. Era um ser humano como outro qualquer.

Quando Cabrini anunciou "Morre Ayrton Senna da Silva", as notícias que pipocavam durante a transmissão já davam a entender que isso era uma questão de tempo.

Hoje vejo que foi o desenrolar no acidente de Ratzenberger que mudou o automobilismo. Se a corrida fosse interrompida, Senna até poderia estar entre nós, mas a que custo? Será que os carros se tornariam tão seguros? Será que teríamos outros acidentes fatais? Infelizmente, o 'sacrifício' de Senna acabou se tornando a salvação de muitos pilotos.

Como disse em outras postagens, considero o automobilismo meu esporte favorito, tanto que não tenho um piloto favorito. Obviamente, Senna está entre os favoritos. Agora, o que me impressiona é ver a quantidade de jovens que nasceram DEPOIS de 1994 e que tem como ídolo o nosso eterno tricampeão. É a certeza que Ayrton Senna jamais morrerá.

Para fechar, um desabafo: triste é aquele que só assistiu Fórmula 1 até 1994. Infelizmente, você nunca gostou de automobilismo. Você gostava somente de Ayrton Senna.

Quem gosta mesmo do esporte JAMAIS deixou ou deixará de ver uma corrida.

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